A 16 de março de 1988, ainda acadêmico, copiei em uma Olivetti Underwood 298, um conto publicado na Revista Veja, denominado "A FLORESTA MÁGICA", de Luís Fernando Veríssimo, que tudo tem a ver com a nossa vidinha tupiniquim, enfatizando o setor político.
No referido texto, o cronista gaúcho apresenta intrincados lances de interesses escusos, passados em local tenebroso (no caso uma floresta), onde a criminalidade e a impunidade imperam, sem que se observe qualquer possibilidade de solução para as iniquidades ali encontradas, como se tudo fosse obra do destino, fado, irreversibilidade.
Devo especificar, de passagem, o momento histórico em que foi escrita a obra. Saíamos de um período ditatorial e era confeccionada uma nova Carta Magna (promulgada a 5 de outubro de 1988, a chamada "Constituição Cidadã").
Coloco tal conto à apreciação, para que todos, adentrando os perigosos caminhos dessa (desta) floresta, tão bem descrita (e não inventada) por Veríssimo, possam tirar suas conclusões:
"A FLORESTA MÁGICA"
Quando o viajante entra na estalagem, todos se apressam a cobrir seus pratos de sopa, com medo de que seja outro ataque em massa dos pivetes, o maior dos bandos que rondam por aquela floresta. Mas, o viajante está sozinho. Ele senta a uma das mesas toscas e pede sopa e pão. O taverneiro pergunta, desconfiado:
- Você tem dinheiro ?
O viajante mostra uma bolsa cheia de moedas, o que causa espanto entre todos à sua volta.
Que coragem, viajar com tanto dinheiro por aquela floresta !
E, que estranho, não ter sido assaltado, ainda !
O taverneiro trás a sopa e o pão e senta-se à mesa com o recém chegado, sem ser convidado. Ele gosta de uma boa conversa.
Começa pedindo que o viajante não o leve a mal, mas não é prudente andar com uma bolsa assim recheada por aquelas paragens.
- Sei cuidar de mim mesmo - diz o viajante.
- Já passei por muitas florestas e nunca fui assaltado.
- Mas o amigo não conhece ESTA floresta... - diz o taverneiro, sombriamente.
- Todas as florestas do mundo têm salteadores - diz o viajante, com desdém.
- Não como esta.
- Todas são iguais.
- Esta é diferente.
E o taverneiro conta que, no princípio, aquela era uma floresta como as outras, com os mesmos perigos, lobos e salteadores, nem mais nem menos do que as outras. Mas o número de salteadores começara a aumentar de uma maneira desproporcional. Mesmo considerando-se que aquela era uma floresta grande como poucas, não era razoável que ali se roubasse tanto. E o Rei mandara um destacamento de soldados para acabar com os salteadores.
- Durante muito tempo não se ouviu mais falar do destacamento. Até que o Rei, curioso, mandou um emissário à floresta para saber o que tinha acontecido. E o emissário foi assaltado - pelo destacamento.
- Pelo destacamento ?
- Os soldados tinham se transformado em salteadores. É alguma coisa mágica na floresta. O ar, a água, alguma coisa.
- O Rei mandou um destacamento maior para prender o primeiro. O resultado foi que o bando dos ex-soldados salteadores aumentou ainda mais com a incorporação do novo destacamento.
- O Rei criou uma comissão para estudar o problema no local.
-O que aconteceu ?
- A comissão hoje está assaltando na floresta. O Rei criou outra comissão, de alto nível, para estudar o problema e o trabalho da primeira.
- E hoje eles também são salteadores...
- De alto nível.
- O rei decidiu que, já que o roubo era inevitável, que pelo menos o reino lucrasse com isso. E começou a mandar coletores de impostos para a floresta. Hoje tem bandos de coletores de impostos assaltando até caravanas de freiras na floresta.
- Finalmente, o próprio Rei decidiu investigar que mistério era esse e entrou, com toda a sua corte, na floresta.
- Não me diga que eles também ...
- Sim. São conhecidos como a Gangue Real e são perigosíssimos.
O viajante, que já desistira do pão e da sopa, começou a se levantar, dizendo que precisava seguir viagem.
O taverneiro o segurou pelo braço...
- É por isso que eu digo - sorriu o taverneiro - que não é prudente andar com uma bolsa recheada de moedas por essas paragens. Deixe a bolsa aqui e siga viagem tranquilo.
- Mas isso é um assalto ! - protestou o viajante, entregando a bolsa.
O taverneiro suspirou:
- Eu sei. Que coisa, não é ? Deve ser o ar, a água, sei lá !
Como toda obra, ela toma forma nos pensares de seu autor e daí por diante passa a pertencer à humanidade, cada um a reescreve de acordo com seus interesses e entendimentos.
Assim, vou deixá-los à vontade nessa (nesta) floresta mágica, para que possam vivê-la com a devida análise.
PS – Não esqueça que neste ano haverá eleição e que se qualquer lei (mesmo a chamada “Ficha Limpa") não for suficiente para obstar as ações de corrupção em todos os níveis, nós, proprietários dos Títulos Eleitorais e herdeiros do que estiver em vermelho no livro caixa, temos plenas condições de extirpar todas as ervas daninhas desta nossa floresta tropical.
BOM COMEÇO !