sábado, 14 de maio de 2011

O “Serial Killer” que matou a flor do “Lócio”.

Na vida criança e adolescente sempre há personagens meio tijolo e meio argamassa, que ajudam a sedimentar as experiências para o amadurecimento individual. Essas figuras, mesmo que pouco ou quase nada tenham realizado, se fixam em cromos amarelecidos, dormentes em brenhas ou em cantos empoeirados do sótão de nossas lembranças.
De repente, um não sei o quê as reavivam, regozijando ou transtornando os pensares do indivíduo que recorda.
Em meu caso, há dias, assistia a um telejornal quando fui atropelado por um sentimento meio maniqueísta que me causou espanto.
Recordei histórias e passeei alguns minutos pelas imagens e mentes de duas entidades antagônicas: 
A primeira, MESTRE Lócio, um sério professor de língua portuguesa, octagenário de ar grave e alma pueril. Ensinava dedicada e delicadamente do alto de seu vozeirão, o tudo que sabia (e como sabia) de sua matéria. Ele circulava livre, a passos largos pela gramática, pela literatura e tantos meandros outros, que tornava as aulas programas imperdíveis ! No detalhe: as ministrava sem manusear livros, lembretes, “improvisos escritos” ou bulas. Eu brincando, dizia que ele era um poliglota em língua portuguesa. Penso que hoje apenas o Pasquale e um ou outro tenham o direito de receber esse título. 
Opostamente, um ser bizarro de nome Haroldo.
Haroldo era um rapazote magricela que habitava e nem cogitava sair da casa da má vontade de aprender qualquer coisa. Suas melhores notas nas “colas” mensais eram medíocres e oriundas da fraqueza ocular do MESTRE, com sua miopia, hipermetropia e astigmatismo em graus estratosféricos. O jovem tinha preguiça até para fazer “cola”.
Corriqueiramente marcávamos grupos de estudos, ora na residência de um, ora na de outro. Haroldo nunca faltava e no bagageiro a característica má vontade. 
Ele sempre nos perguntava quem participaria dos estudos e ao respondermos os que iriam conosco, ele retrucava: “que vai conosco o quê – é que vai cum nóis !”
Dois tipos opostos que ficaram guardados, por muito, no meu álbum da vida.
Como afirmei, um estopim fê-los retornar do mundo de meus contos infanto-juvenís: os livros didáticos usados pelo MEC, que por hora permite, irresponsavelmente, que trucidem uma das nossas mais valiosas identidades culturais, a nossa língua.
Nego-me a citar o nome da autora desse desastre, bem como a colocar minha opinião na berlinda. Busquem e tirem suas próprias conclusões.
Eis que das cinzas do esquecido ressurge o "serial killer" de nossa língua, matando-a por outras várias vezes, como o fez com MESTRE Lócio e, não satisfeito, ainda influencia malignamente os doutos que se tornaram favoráveis a estes absurdos, após formarem seus filhos em escolas particulares e semearem zeros às pamparras nas provas de redação dos vestibulares.
Haroldinho, o espectro que agora “vai cum nóis pra salas di aulas.”
Meus pesares ao Brasil.




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