Quinta-feira...
Pensando na Páscoa que ai vem, meu filho mais velho pediu-me menos acidez nas linhas e menos entrelinhas entre as linhas de meu texto dominical. Dizia-me dos momentos de introspecção, reforma, renascimento, neste período do ano, como ocorre nos festejos de Natal.
Deitava-lhe eu a devida atenção, porém, não posso negar, enquanto o ouvia, meu cérebro buscava temas variados, os quais tentaria trazer à pena, gostosamente escritos. O vozerio ensurdecedor de minhas vontades gritava concomitantemente ao seu conselho: saúde pública ou doença pública, copa do mundo de futebol 2014 e Olimpíadas 2016 (o Brasil pedindo o retorno da inflação), os interessados pelo turismo sexual, armas X almas e por ai ia... Meus dedos clicando assuntos, abrindo janelas, dançando teclas..., e ouvindo, e pensando...
No telejornal, a notícia da morte de dois, baleados por um terceiro, devido ao desentendimento de duas crianças em um jogo de bolinhas de gude.
De soslaio, para não magoar as palavras do meu filho interlocutor, olhei o ar da âncora do programa e a vi titubeante completando a nota, parecendo pedir desculpas pelo assunto estar ali escancarado.
Vamos falar da Páscoa, disse a moça, como se esta fosse a porta indicativa da saída da masmorra.
Lembrei-me de todos os informes hodiernos; a cada noticiário a sensação de assistir a um filme de horror repleto de sandices e crueldades.
Não vou aqui defender a idéia de um azul outrora, nas tvs.
Em meus idos anos 60, quando a década se iniciava, não tínhamos ainda um aparelho de televisão em nossa casa. À noitinha, corríamos para a casa do vô (nosso vizinho, um velhinho quase secular, em sua constante e magra calça caqui que exercitava sempre passos lentos, acho que devido ao peso do seu graúdo coração), onde chamavam-nos televizinhos.
Os jornais de horário nobre apresentavam variedades, com pequenos gotejamentos de violência. Ainda assim, antecedendo o noticiário, uma tarjeta do serviço federal de censura regulava os olhos e proibia vontades dos menores espectadores.
Pouco se mostrava da fase de correntes e torturas, na qual a idade média se fazia presente nos ideais e nas idéias idiotas.
Os fardados, com estrelas (em máximo de quatro), enfiavam verdades goela abaixo da horda contribuinte. Uma delas, que as forças armadas (os mocinhos), lutavam contra os terroristas (os bandidos). Na média, talvez pudéssemos dizer que a contenda era travada entre militares (bons e maus) que defendiam idéias gringas de civis maus e civis (bons e maus) que defendiam idéias gringas de militares maus. Era uma relação bélica importada (como foi em toda a América Latina pós Cuba).
Mesmo o devastador agente laranja no Vietnã, as balas, as bombas, a mortandade, foram mais enfáticas nas vozes de Dylan(s) e Baez(es), que nas imagens formadas pelos tubos de raios catódicos.
Com o tempo, os focos se alteraram, mas, os litígios permaneceram, arquitetados sempre pelo mesmo autor - o homem: o homem você; o homem eu; o homem nós, e as guerras, catástrofes, sequestros, chacinas, cada vez mais se fizeram presentes, patrocinados pelas quaisquermulti, ao vivo, em nossas LEDs 40”, defronte as quais nos sentamos com pratos nas mãos e sentimentos anestesiados.
Morte ao vivo, mesmo com os ensejos de boa Páscoa...
Quanto sentimento humano no ar titubeante da âncora do telejornal.
Vamos falar de Páscoa, disse a moça.
Como seria bom o ser humano sair dessa masmorra de violências...
Uma boa PÁZCOA para todos nós!
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